Estávamos em 1975. Chegara o mês de Novembro e a confusão mantinha-se com o espectro da guerra civil a pairar. Era o tempo de Pinheiro de Azevedo (o “bardamerda-para-isto-tudo”) e do sequestro da Assembleia da Republica. Um país partido ao meio, dividido entre o Norte e o Sul. Em cima, os "tradicionalistas", e em baixo os “progressistas”. Rio Maior e as suas mocas, faziam a fronteira. Um dia o governo decide cortar o pio à Rádio Renascença (a rádio mais vermelha e a emitir em roda livre!), como não tinha militares do seu lado para o fazer (tal era a balbúrdia!) pede a um pequeno grupo operacional que opta por dinamitar a antena emissora. Entretanto, os Paraquedistas que controlavam aquela rádio, decidem ocupar as bases aéreas expulsando todos os oficiais, enquanto Otelo (o romântico) distribui G3’s por toda a extrema-esquerda (incluindo civis). E aqui começa o contar de espingardas. De um lado, Paraquedistas, Policia do Exercito e Fuzileiros estavam com a esquerda, apadrinhados por Otelo que ainda comandava o COPCON. A direita militar tinha Eanes (o homem dos óculos escuros que nunca ria) e os Comandos de Jaime Neves (o valente). No dia 25 de Novembro, Jaime Neves e os Comandos atacam e neutralizam a Policia do Exército na Calçada da Ajuda, onde morreram duas pessoas. As outras bases militares foram sendo ocupadas e controladas pelos Comandos, sem violência. Na RTP-Lisboa, um oficial barbudo ainda anunciava a vitória e a grandeza do poder popular, até começar a esbracejar indignado, sendo “substituído” no ecrã por um filme emitido a partir do Porto. Tinha acabado a revolução, o PREC e com isso toda uma época de rebaldaria. E começou um novo ciclo em Portugal, a democracia, que permitiu até que o PCP continuasse a existir (Melo Antunes, o iluminado). Por tudo isto e muito mais, 25 de Novembro sempre!
Entretanto, Otelo abandonava a tropa e abraçava uma carreira no terrorismo, em prol da classe operária. Mas isso já é outra conversa...
Nuno V. Leal
Quando escreves "...E começou um novo ciclo em Portugal, a democracia, que permitiu até que o PCP continuasse a existir..." é um preconceito teu ou um facto histórico?
ResponderEliminarDa forma como contas, parece que o golpe começou no sector moderado, como ainda afirma os comunistas...
ResponderEliminarHavia muito mais para dizer. O 25/11 segue o Verão quente, começou com o documento de Agosto do grupo dos nove (facção moderada do MFA, com Pezarat Correia, Canto e Castro, Sousa e Castro, Vasco Lourenço, Victor Alves, Victor Crespo, o cabecilha Melo Antunes, Franco Charais e Costa Neves), que advogm uma sociedade socialista democrática inspirada na social-democracia europeia, em contraponto com o documento de Julho "Aliança Povo/MFA".
Os ânimos aqueceram com a substituição de Otelo por Lourenço (a 20/11) como comandante da região militar de Lisboa, com o poder estratégico que daí advinha.
O barbudo chamava-se Duran Clemente.
Também o PCP esteve envolvido no armamento da populaça, mas Costa Gomes conseguiu que Cunhal não se empenhasse até ao fim e efectuasse uma retirda estratégica. Foi assim que, ao contrário da Rússia1917, não se passou à segunda fase da revolução, com o aniquilamento dos outros partidos e a deposição de Kerensky (que Kissinger assemelhou a Mário Soares, cá com outro desfecho).
Perderam o PCP, o MES pós-Sampaio, LUAR, PRP e a UDP (Mário Tomé foi dos poucos presos), dois pais do Bloco de Esquerda.
Freitas, dias depois na AR, disse que o 25/11 podia ter sido a substituição duma ditadura agrária de direita por uma ditadura comunista, mas que ainda sobravam duas vias em luta, o socialismo pluralista do MFA vencedor, e uma democracia pluralista.
Sim, porque Costa Gomes defendia que a sociedade devia caminhar para o socialismo.
Há um livro muito giro sobre o assunto, o pulsar da revoçução, das Edições Afrontamento, conta dia-a-dia, mesmo hora-a-hora o que sucedeu entre 1973 e 1976.
Obrigado Luis. Isto sim, é serviço público ao povão.
ResponderEliminarDias depois do 25/11, Carlos Brito do PCP (ex da Zita Seabra e muito mais tarde auto-suspenso do PC) foi espremido pelo PS, PPD e CDS na AR, sobre o apoio do PC à sublevação. Refugiou-se num "o PCP desaprova os acontecimentos tal como se verificaram" (claro, correu-lhes mal a intentona), provocando risos e aplausos da bancada do PPD. Sobre os militares sublevados, Brito disse "condenamos a acção, mas compreendemos a sua justificada indignação" (um não, mas - como noutras paragens e noutros tempos se diria não ao terrorismo da ETA ou da Fatah, mas compreendemos os seus anseios).
ResponderEliminarExpresso, 3/12/1975 (parêntesis meus)
Carlos Gouveia:
ResponderEliminarQuando refiro que permitiu quero dizer que o Melo Antunes impediu uma caça às bruxas ao PCP - coisa que os mesmos pretendiam fazer a toda a direita. É (também) por isso que considero que se iniciou a democracia.
Luís Duarte:
Agradeço as correcções e os acabamentos (se me permites, claro!). O texto do post é curto e não contempla toda a história porque eu não sou do tipo post-paralelipípedo e prefiro sintetizar (se reparares até retirei o badochas do Vasco Lourenço da foto). Mas se quisesse enriquecer a historia teria de falar no ruinoso processo de descolonização, no Verão “aquecido” e no alienado do Vasco Gonçalves; nas manifestações dos SUV (não confundir com sport utility veicule); nos Tribunais Revolucionários anunciados para o Campo Pequeno pelo Otelo e o Cunhal; teria de lembrar o Cavalo Branco e o debate do “olhe que não”, que foi no inicio de Novembro; na manifestação do “povo é sereno”. Passaria pelo Morais e Silva dos Paraquedistas que ordenou – a mando do governo com o aval do CR – a morteirada na antena da RR ; falaria no Documento dos 9; no Gomes Mota e na ideia do governo entrar em greve; na ida do louco do Ribeiro Pacheco dos Fuzileiros ao COPCON para se oferecer ao Otelo; no telefonema do Otelo à marmota do Costa Gomes a dizer que a malta da RML não queria lá o Lourenço no lugar dele; o COPCON e a sua rapaziada (Otelo, Costa Martins, Tasso de Figueiredo, Mário Tomé e companhia) dariam muito assunto. Enfim, muito há para escrever…A minha ideia era comemorar o outro dia da liberdade e homenagear o Jaime Neves. Deu para perceber que tinhas algo preparado para a efeméride. Lamento não ter lido o tal livro muito giro.
Nuno, ainda não tinha preparado nada, mas teria postado, não fosses tu dizer o essencial. Acho que o dia merece uma homenagem, e acho que a fizeste muito bem: o 25/11 corresponde às 23.59h do 25/4, um longo dia de revolução que demorou 19 meses.
ResponderEliminarA minha intenção era, enquadrando o dia, sublinhar que quem mexeu primeiro a torre e o cavalo foi a esquerda não democrática.
De facto, havia muito mais a contar, foram dias fantásticos. E realmente o meu comentário nunca mais acabava (eu sou um dos paralelipípedos)...
Quando for ao cartaxo, levo-te o livro.
O que alguns de vocês não sabem, ou porque eram muito novos na altura, ou porque não tivessem tido acesso a essa informação, é que aqui na nossa santa terrinha o Cartaxo, havia um grupo de denominados "comunistas", (que sempre invejaram o que os outros, não comunistas, tinham conseguido com esforço e trabalho árduo), com uma lista de pessoas que tinha casa própria e, "no caso de a coisa dar para o torto nesse 25 de Novembro", ocuparem as suas casas.
ResponderEliminarCaro anónimo,
ResponderEliminarNão se iniba! Deite cá para fora!
Debaixo dessa "capa" pode sempre elucidar-nos acerca de um tempo em que nós ainda vivíamos em inconsciência (politica) e uma vez que ainda éramos todos muito nóvinhos...Eu sempre ouvi falar dos informadores da PIDE no Cartaxo. Já me apontaram alguns deles (ainda vivos), mas como - pelos vistos - o anónimo sabe, é sempre mais interessante ouvir falar disso através de quem viveu essa experiencia. Vá lá...