Acresce o detalhe das embevecidas* entrevistas –
mesmo as perguntas teoricamente mais assertivas servem de passadeira vermelha para
Salazar explanar o seu argumentário -
terem sido submetidas à apreciação prévia do lente coimbrão e terem sido redigidas
de memória (Ferro guardou o bloco, em detrimento duma conversa mais fluída) -
como escreve Salazar no prefácio, as respostas passaram pela pena do jornalista, ganhando uma beleza literária que de seu
natural não tinham.
O objectivo? Como justifica na Introdução, Ferro
pretende saber quem é o novo presidente do Conselho (‘Talvez um teimoso, talvez um visionário, talvez um orgulhoso, talvez um
insensível, um inadaptado dentro da sua raça, mas um homem indiscutivelmente
honesto e inteligente.’) e saber se ele pretendia aplicar o bem-sucedido
método aplicado na pasta das finanças – cuja descrição parece actual (ver
caixa) -, ‘ao orçamento errado,
desequilibrado, da própria alma da raça, às suas verbas excessivas e às suas
verbas insuficientes, valorizando aqui certas qualidades, reduzindo taras e
defeitos acolá. Impostos, imposições, sobre certas reacções individuais… O combate
metódico, mas tenaz, a um défice de virtudes e os esforços consequentes para
chegar a superavit…’
E hei-lo, sozinho, e frente da crise,
desprezando a sua grande cultura financeira, armando-se temporariamente com as
quatro operações aritméticas: somar, diminuir, multiplicar e dividir… O
primeiro movimento foi de incredulidade perante este critério simples de dona
de casa. (…) Como resistir ao cautério, ao peso das contribuições, ao arrumo
forçado, violento, das contas do Estado? (…) Foi o momento, a hora difícil do
dr. Oliveira Salazar, como ministro das Finanças. Por toda a parte, nos cafés,
nos eléctricos, nas lojas, nos Bancos, nas casas burguesas, à hora do jantar, a
campainha de alarme, o verdadeiro pânico: «Mas este homem é um louco!... Mas
este homem tira-nos a pele!... Mas este homem leva-nos à ruína!...», O dr,
Oliveira Salazar teria soçobrado, nesse momento, se tivesse dado o flanco, se
tivesse discutido, se tivesse saído da sua terrível e admirável serenidade. (…)
Os que tinham sentido o seu país *a beira da ruína foram-se levantando, hoje
um, amanhã outro, confusos, feridos, amachucados, apalpando-se a si próprios,
espantados pelo milagre: «Pois será possível? Ainda estamos vivos?» Alguns, é
certo, nunca mais puderam erguer-se, mas foram aqueles, talvez, que tinham os
seus dias contados…
Quem ler o livro, ou este resumé (leva o tempo de fazer uma tosta, é favor ligar a torradeira)
conclui que Salazar era um homem do seu tempo, com os preconceitos naturais à
época, apóstolo dum governo musculado (no rescaldo duma 1ª república caótica e pouco
democrática) e descrente no parlamentarismo e dos seus debates estéreis,
visando apenas o poder. Era um homem do seu tempo em 1932, mas, senão antes, em
45 já o seu tempo passara.
ANTI-PARLAMENTARISMO,
UM SINAL DOS TEMPOS
A primeira entrevista parte do seu discurso de 23
de Novembro, onde Salazar dá ordem de desmobilização às direitas conservadoras,
católicos e monárquicos, atacando a lógica de facções, pois é hora da união
nacional - só falta o grito de batalha, por
São Jorge, a mim!
´Nós temos uma doutrina e somos uma força. (…) Nestas circunstâncias não há
acordos, nem transições nem transigências possíveis. Os que concordam com o
nosso programa fazem um acto patriótico, declarando a sua concordância e
trabalhando abertamente a nosso lado; os que não concordam podem ser igualmente
sinceros e dignos confessando a sua discordância, são mesmo livres de
proclamá-la mas, no que respeita a uma actuação política efectiva,
levá-los-emos pelo melhor modo possível a que não nos incomodem demasiadamente.
(…) Não estão connosco os que preferem à
obediência a sua liberdade de acção nem os que sobrepõem às directrizes
superiormente traçadas as indicações da sua inteligência, ainda que
esclarecida, ou os impulsos, ainda que nobres, da sua vontade.’ (discurso)
Salazar afirma que a Ditadura se fez contra o
espírito partidário, que a Constituição não facilitará a ressurreição dos
partidos e que não deixará formar até agrupamentos dentro da Situação. A sua
opinião é linear, ‘Os partidos – não o
esqueçamos – eram em geral grandes agências de colocações onde se entrava, como
se entra nas bichas, para esperar vez, para aguardar a fatal distribuição de
benesses na hora do Poder.’
Na 5ª entrevista, volta à carga: ‘Eu
não tenho horror aos partidos, dum modo geral, tenho horror ao partidarismo em
Portugal. A Inglaterra vive, pode dizer-se, há séculos com os seus dois
partidos alternando-se no poder, e até ao presente têm-se dado bem com isso.
(…) A terapêutica da Nação doente, retalhada, exige-nos uma imobilização, que
pode ser definitiva ou demorada, de toda a acção política fragmentária. (…) eu
sou, de facto, profundamente anti-parlamentar porque detesto os discursos ocos,
palavrosos, as interpelações vistosas, e vazias, a exploração das paixões não à
volta duma grande ideia, mas de futilidades, de vaidades, de nadas sob o ponto
de vista do interesse nacional.’
Na
derradeira conversa, Salazar volta a advogar a governação em petit comité, ‘Há
certas leis que se tornariam perigosas ou se prestariam a especulações
inconvenientes se não fossem elaboradas em silêncio, como, por exemplo, aquelas
que dizem respeito a direitos’,
embora reconheça que ‘todo o poder sem
fiscalização, até quando se trata de um bom governo, tem tendência para
exorbitar’.
A AUTORIDADE
E A LIBERDADE
Salazar é peremptório, na 2ª entrevista, ‘Autoridade e liberdade são conceitos
incompatíveis… Onde existe uma não existe a outra…’, recorrendo a um
argumento simiesco: ‘A liberdade vai
diminuindo à medida que o homem vai progredindo, que se vai civilizando. Desde
o homem primitivo, absolutamente livre no mundo da sua floresta, ao homem de
hoje, que obedece a sinais, obrigado a seguir, nas ruas duma cidade, pela
direita ou pela esquerda, quanta distância percorrida, quantos progressos
realizados. Entreguemos, pois, a liberdade à autoridade, porque só ela a pode
administrar… e defender. (…) A liberdade garantida pelo Estado, condicionada
pela autoridade, é a única possível, aquela que nos pode conduzir, não digo à
felicidade do homem, mas à felicidade dos homens.’
Na última entrevista, 6 anos depois, Salazar
insiste, ‘Não pode haver liberdade contra
a verdade; não pode haver liberdade contra o interesse comum’ – a sua
verdade e o interesse comum visto por si, devia acrescentar-se.
A CENSURA,
UM MAL NECESSÁRIO
‘Chego a
pensar que a censura é uma instituição defeituosa, injusta, por vezes, sujeita
ao livre arbítrio dos censores, às variantes do seu temperamento, às
consequências do seu mau humor. Uma digestão laboriosa, uma simples discussão
familiar, podem influir, por exemplo, no corte intempestivo duma notícia ou da
passagem dum artigo. Eu próprio já fui em tempos vítima da censura e
confesso-lhe que magoei, que me irritei, que cheguei a ter pensamentos
revolucionários…’
Na 2ª entrevista, assim começa Salazar a sua
prédica sobre a censura, pretendendo ‘reduzir a sua acção ao indispensável’,
mas que crê necessária: para evitar ‘que
se deturpem os factos, por ignorância ou má-fé, para fundamentar ataques
injustificados à obra dum governo’; como instrumento moralizador, já que
alguma imprensa oferecia ‘uma imagem de
saguão: intrigas, insultos, insinuações, pessoalismos, provincianismos, baixa
intelectualidade. Ora o jornal é o alimento espiritual do povo e deve ser
fiscalizado como todos os alimentos’; para impedir, não a boa doutrina, sem
acinte e com boa fé, mas a ‘doutrina
subversiva, demasiado habilidosa’.
Na 7ª entrevista, respondendo às críticas dos
liberais franceses e ingleses acerca do analfabetismo lusitano, e trazendo à
baila a ofensiva do comunismo internacional, Salazar encontra mais uma razão
para amordaçar o povo: ‘A censura, hoje,
por muito paradoxal que a afirmação lhe pareça, constitui a legítima defesa dos
Estados livres, independentes, contra a grande desorientação do pensamento
moderno, a revolução internacional da desordem. Eu não temo o grande jornalismo
desde que seja português e o demonstre. O que temo são os pequenos jornalistas
que se desnacionalizam sem dar por isso, talvez por não estarem suficientemente
armados para se defenderem de sedutoras e fáceis teorias’.
OS ISMOS
Nessa 2ª
entrevista, há espaço para Salazar se demarcar do capitalismo, ‘É evidente que
o capital precisa de ser transformado, disciplinado, educado, de molde a
beneficiar mais a colectividade, no sentido dum maior rendimento social’, mas
também para morder no Estado XXL a que se cola boa parte da nação: ‘Esse Socialismo de Estado, que muitos apregoam e
aconselham como um regime avançado, seria, na verdade, o sistema ideal para
lisonjear o comodismo nato e o delírio burocrático do comum dos portugueses.
Nada mais cómodo, mais garantido, mais tranquilo, do que viver à custa do
Estado, com a certeza do ordenado ao fim do mês e da reforma no fim da vida,
sem a preocupação da ruína ou da falência. O Socialismo do Estado é o regime
burguês por excelência. A tendência para esse regime, entre nós, deve,
portanto, procurar-se mais no fundo, falho de iniciativa da nossa raça do que
noutras preocupações do ordem social. O Estado não paga mal e paga sempre. É-se
desonesto, além disso, com maior segurança, com segura esperança de que ninguém
repare. As próprias falências, os desfalques, as irregularidades, se há
compadres na governação, são facilmente abafados e os défices cobertos – regalia
única! – pelos orçamentos do Estado. As iniciativas, por outro lado, não
surgem, não progridem, porque o patrão é imaterial, quase uma imagem. As coisas
marcham com lentidão, com indolência, com sono.’
A BRANDA
VIOLÊNCIA
Na inquirição seguinte, Salazar procura afastar-se
de Mussolini, a quem chama de admirável
oportunista da acção, e do fascismo, que considera um caso nacional
irrepetível, cuja violência constante não se adapta aos nossos brandos
costumes: ‘Há que governar, portanto,
tendo sempre em conta esse sentimentalismo doentio a que nós estamos habituados
a chamar bondade. A Ditadura para realizar a sua obra tem de ser calma,
generosa, um tudo nada transigente, vagarosa até. Ela perderá em tempo mas
ganhará em eficácia e solidez: uma Ditadura de direito sem dar grandes asas ao
poder pessoal. (…) Há problemas de interesse nacional, de interesse colectivo,
que se resolveriam facilmente com duas penadas, passando por cima de tudo, de
todas as leis, de todas as normas, de todos os obstáculos individuais. Mas o
bem que uma vez se faz, pode ser inutilizado pelo muito mal que outras vezes se
poderia fazer. Um poder sem limites, rápido, decisivo, tem suas seduções, suas
vantagens e seus perigos.’
Salazar, ‘o
primeiro a reconhecer que há, talvez, maior saúde, maior justiça, maior
claridade, num poder pessoal largo, bem compreendido e dirigido. Simplesmente,
para usar desse poder pessoal, é preciso encontrar homens raros, homens
moralmente excepcionais, com uma grande disciplina interior, uma vontade firme
e uma inteligência clara’, vê-se como um príncipe iluminado: à pergunta de
Ferro, se não estará ele nessas condições, Salazar sorri e responde um singelo muito obrigado.
Às notícias de maus tratos a presos políticos,
Salazar começa por sublinhar que alguns casos tinham fundamento, tendo sido
tomadas imediatas providências, mas que ‘os
presos maltratados eram sempre, ou quase sempre, temíveis bombistas que se
recusavam a confessar (…) Só depois de empregar esses meios violentos é que
eles se decidiam a dizer a verdade. E eu pergunto-me a mim próprio, continuando
a reprimir tai abusos, se a vida de algumas crianças e de algumas pessoas
indefesas não vale bem, não justifica largamente, meia dúzia de safanões a
tempo nessas criaturas sinistras…’ Sinistro.
A MISÉRIA,
SECREÇÃO DO PROGRESSO (subtítulo da 7ª entrevista)
Ao 3º dia, o Estado social: ‘O subsídio sem o
trabalho compensador desmoraliza os indivíduos, torna-os indolentes,
comodistas, completamente inúteis à vida duma sociedade. O subsídio a troco de
trabalho, pelo contrário, não desabitua os homens da sua função natural dentro
da vida e enriquece o País com o acabamento e a iniciação das obras públicas (…)’
Faz lembrar o RSI, não faz?
Na mesma prosa, Salazar considera a mendicidade um
falso problema, que induz estrangeiros e nacionais em erro, facilmente
resolúvel - varra-se para baixo do tapete: ‘Essa
mendicidade não é um índice de miséria porque é antes um vício, porque a
maioria dos que pedem não precisam de pedir. O caso mão tem, portanto, a
gravidade que se lhe atribui, salvo a sua teatralidade explorável, e pode ser
resolvido, se houver boa vontade, castigando, severamente, os falsos mendigos,
devolvendo à procedência, à sua terra natal, os pobres que não são de Lisboa e
metendo os restantes, os autênticos, nos asilos existentes e noutros que se
improvisem para acudir, urgentemente, a esse mal.’
Em suma, a mendicidade é anti-patriótica.
O MÍSTICO
DAS CIFRAS
Na 4ª entrevista, Ferro ousa uma crítica que ainda
hoje se lhe faz, ‘Há quem diga – com aparente
razão, pelo menos – que o Estado português pode ter enriquecido, através da
obra notável do seu ministro das Finanças, mas que o indivíduo está pobre,
quase na miséria…’, e Salazar justifica a austeridade: ‘Nesses períodos de cura, pode reduzir-se, efectivamente, o poder de
compra do indivíduo, mas essa redução é sempre compensada pelos benefícios duma
administração severa e honesta’.
Mais adiante, considera-se partidário ‘duma certa severidade fiscal, tendente não
ao imposto esmagador da economia individual, mas ao imposto forte, estímulo
daquela, condição de progresso pelas vantagens colectivas que pode criar. (…) A
solução, portanto, é arrancar ao indivíduo essas contribuições, que, no fundo,
não lhe adiantam nem atrasam e que podem ser, convenientemente orçamentadas,
uma fonte de riqueza e prosperidade…’
A forma, aliás, como o ditador vê os críticos, é
curiosa: na 6ª entrevista, um freudiano Salazar justifica o descontentamento
‘de certos sectores’ com a nova prática política, que não atende a interesses
individuais, e com a natureza dos portugueses, que os torna um pouco tristes,
descontentes, um tudo-nada revoltados: ‘Há
um abismo entre a nossa inteligência, viva e pronta, de meridionais, e a nossa
débil vontade, pouco paciente, pouco tenaz. Este abismo provoca, no meu
entender, um verdadeiro desequilíbrio psíquico.’
A MULHER
‘Nos
países ou nos lugares onde a mulher casada concorre com o trabalho do homem (…)
a instituição da família, pela qual nos batemos como pedra fundamental duma
sociedade organizada, ameaça ruína… Deixemos, portanto, o homem a lutar com a
vida no exterior, na rua… E a mulher a defendê-la, a razê.la nos seus braços,
no interior da casa… não sei, afinal, qual dos dois terá o papel mais belo,
mais alto e mais útil. (…) De resto, as mulheres portuguesas não têm que se
queixar de nós. O nosso estatuto constitucional marca-lhes uma conquista:
reconhece-lhes, com as possíveis restrições, igualdade de direitos e até, em
certas condições, o direito ao voto…’ (5ª entrevista)
E não se queixem, parece pensar.
A VANGUARDA
DO POVO
Os extremos tocam-se. As palavras lidas na 7ª
entrevista poderiam ser escritas por Estaline, só que em cirílico: ‘A opinião pública é indispensável à vida
de qualquer regime. Os governos por mais apoios de que disponham, não se mantêm
usando a força, mas mantendo-a (…) Simplesmente essa opinião pública pode viver
abandonada a si própria ou ser convenientemente dirigida…’
Ferro pergunta
se Eugénio d’Ors não terá razão ao defender a necessidade, em certas épocas
históricas, da política de missão, aquela que procura salvar o povo contra si
próprio, e Salazar responde que ‘os
governos nunca se devem escravizar a opinião das massas, sempre inferior e muito
diferente da opinião pública da Nação. Em resumo, a opinião pública é
indispensável ao governo dos povos, constitui, por vezes, um grande
estimulante, mas nunca se deve perder, a bem da sua própria saúde, o controlo
da sua formação.’ Um verdadeiro engenheiro de almas.
Mais adiante, uma confissão, ‘A verdade é que não poderia adular o povo sem trair a minha
consciência. Nós constituímos um regime popular, mas não um governo de massas,
influenciado ou gerido por elas.’ Afinal, quem é que manda aqui?
POBRES E
HONRADOS
Nessa última conversa, como vê Salazar o seu povo?
‘Bondoso, inteligente, dócil,
hospitaleiro, trabalhador, facilmente educável, culto…’, mesmo que com
fraca instrução, e ‘Excessivamente
temperamental, com horror à disciplina, individualista sem dar por isso, falho
de espírito de continuidade e de tenacidade na acção. A própria facilidade de
compreensão, diminuindo-lhe a necessidade de esforço, leva-o a estudar todos os
assuntos pela rama, a confiar demasiado na espontaneidade e brilho da sua inteligência.
Mas quando enquadrado, convenientemente dirigido, o português dá tudo quanto se
quer.’ Esses defeitos são resolúveis com a formação de elites que eduquem e
dirijam a Nação, considerando Salazar ‘mais
urgente a constituição de vastas elites do que ensinar toda a gente a ler. É
que os grandes problemas nacionais têm de ser resolvidos, não pelo povo, mas
pelas elites enquadrando as massas.’
‘Quero
levar os portugueses a viver habitualmente’, disse Salazar a Henri Massis. ‘É
mais humano e mais cristão procurar antes aquela mediania colectiva em que não
são possíveis nem os miseráveis nem os arquimilionários’. Quem pode ficar
satisfeito com a mediania, é a questão.
No prefácio do livro publicado à época, um pouco
ambicioso Salazar vê a Pátria como ‘uma
casa branca, cheia de sol, num quintal cuidado, em que a vida é pacífica,
alegre, operosa e digna.’ Só falta mesmo o cheirinho a alecrim...
No mesmo texto, um assomo de lucidez, ‘Contra uma consciência pública esclarecida
e generalizada não há possibilidade de os Governos se manterem duradoiramente,
ao menos sem um certo desenvolvimento de força, nem sempre legítimo’ e um
misto de mito e profecia, quando analisa a imagem que as entrevistas lhe
conferem, alguém que ‘tem todo o ar de lhe ser indiferente estar ou ir; em todo
o caso, está. Está e está há tanto tempo e tão tranquilamente como se ameaçasse
nunca mais deixar de estar’.
A rematar o prefácio, uma prova de que o
anti-político era um Maquiavel encartado: ‘Peço desculpa de ter escrito este
Prefácio. Não é que me envergonhe de o haver feito; é que me roubou tempo de
que precisava para outras coisas’. Haverá demagogia maior?