quarta-feira, 29 de junho de 2011

EOLO DECIDIU A PELEJA


9 de Maio de 1588. Esperando que o tempo melhorasse e tudo estivesse pronto, as cordas presas, as tábuas pregadas e os baús nos porões, os barcos (43 deles portugueses, incluindo 9 dos melhores galeões) zarparam de Lisboa, com 20 a 28 mil marinheiros e soldados, e 123790 balas de canhão. Aquela herege da ex-noiva havia de sentir o ferro do país mais poderoso do mundo, ao serviço de Deus Nosso Senhor. Ou não fosse esta a grande e felicíssima armada...

Por essa altura ninguém conhecia a lei de Murphy, mas ela já dava provas: se alguma coisa pode dar errado, ela dará.
Para começar, o atraso de 1 ano: um vendaval destruíra várias embarcações ancoradas em Lisboa, enquanto a peste se propagava nas docas. Em Fevereiro, morreu o almirante que empreendera a frota, obrigando à sua substituição por Medina Sidónia, que não era marinheiro.
Depois foi a falta de vento na costa portuguesa - a frota demorou 19 dias só para sair de Belém e passar a barra do Tejo-, o vento que empurrou parte da frota para o Algarve e uma tempestade no cabo finisterra, que separou a armada. Paragem de 1 mês na Coruña, para reagrupar.
30000 soldados do duque de Parma deviam ser apanhados em Dunquerque, mas os insurrectos holandeses bloquearam o porto. Um grande contratempo, mas a vantagem permanecia.


Entre 29 de Julho e 6 de Agosto, as duas armadas mediram-se de longe, com incursões esporádicas bretãs e troca de bolas de canhão.
A 7 de Agosto, enquanto fundeava em Calais, a frota foi arremessada com 8 barcos em chama, largados pelos ingleses a favor do vento e das marés.
O pânico dos paquidérmicos barcos do Rei (quem cortou as âncoras viria a pagar por essa precipitada decisão) e a perda da formação em meia-lua permitiram o assalto dos ilhéus, em pequenos mas velozes barcos, mas com maior alcance de tiro, numa espécie de toca-e-foge, ou cercando barcos isolados.
Mas a maior frota do mundo não conseguiu ripostar, pois o vento arrastou-a para norte, sem amainar, apesar dos seus desesperados esforços para se aproximarem dos barcos bretões, e atacá-los de barlavento e a pequena distância, como bem instruíra o Rei prudente. Em vão.


Passaram dias, os animais adoeceram, o escorbuto e o tifo fizeram o papel da Ceifeira, a comida estragou-se e uma humilhada frota foi obrigada a contornar as ilhas.
Não resistindo às costumeiras tempestades de Setembro, mais de 50 navios afundaram na implacável costa da Irlanda (só 5 haviam perecido na batalha de gravelines): poucos dos que chegaram às praias escaparam a execuções sumárias, fugindo pela católica Escócia.
A Santander chegaram galeões desconjuntados, com cabos a prender as velas, e um almirante agónico. Dos 130 navios (22 galeões e 108 navios mercantes adaptados), aportaram entre 35 e 53.
Foi castigo pela soberba, ou acaso climatérico: terá dito o desolado Filipe II "não mandei os meus navios combater os elementos".

Mas imaginem que o dia ´tava bom e o vento de feição. Fosse vitoriosa a armada invencível (termo jocoso inventado pelos ingleses), a história do mundo seguia por outra porta, e tinha que ser rescrita.
Olhem, o william não tinha conhecido a kate.

A MINHA VIDA NÃO É ISTO (parte 4)


Tenho um amigo que tem um conceito apurado de probidade, no geral. Como eu, critica o desgoverno do país, os abusos do RSI, o enriquecimento de quem parte e reparte, os favores e os robalos.
Como milhares que ponderam emigrar deste país sem futuro, contou-me há dias que vai à Suíça tentar arranjar emprego, onde (diz) o salário mínimo é de 1500€. E correu assim o diálogo:
- E ainda pagam mais 300 ou 400€ para quem tiver filhos.
- Mas levas o teu miúdo?
- Não, mas eles não sabem.
- Ouve lá, isso não uma chico-espertice? Vai daqui o tuga e engendra logo esquemas.
- Para eles não é nada, e estamos a falar dum país que prosperou a guardar dinheiro roubado por ditadores, é o ouro judeu, é a conta-poupança de Mogabe. Não tenho pena deles.

Havia muito a dizer sobre a lusa alma, ou sobre as justificações-barra-desculpas que desencantamos, mas eu pensei, pensei, pensei e, como o professor baltazar, tive uma ideia:
As pessoas de quem gostamos não têm defeitos,
têm idiossincrasias.
.

A MORDAÇA




O DRAMA DE UM PODE SER UMA TRAGÉDIA,
O DRAMA DE MILHÕES É UMA ESTATÍSTICA.

Orlando Figes já pos no prelo seis livros, todos sobre a Rússia. Um deles, há pouco publicado em Portugal, chama-se
Susurros - A Vida Privada na Rússia de Estaline.
Com esta obra, o historiador colige milhares de histórias pessoais, em primeira mão, recolhidas por uma equipa de investigadores, sobre o terror e as purgas estalinistas, e o medo que obrigava as pessoas a sussurrar e/ou a denunciar.
Em vez da estatística, tipo "O livro negro do comunismo" - 25 milhões objecto de repressão, 3 milhões de fuzilados, 4.6 a 8.5 milhões de mortos -, Figes mostra as tragédias individuais e dá nomes às vitimas: pessoas que esconderam (até reciprocamente) aos cônjuges o parentesco com "inimigos do povo", que perderam os pais nos gulags, que não falavam alto nem na solidão dos lares. Histórias de sobrevivência e, principalmente, sobre o Medo com letra grande, que ajoelhou 200 milhões de russos.
Medo duma palavra mal escolhida ou mal ouvida, medo dum bater à porta, medo do cunhado cobarde, do vizinho invejoso ou do colega despeitado, qualquer deles um possível delator - fosse o camponês mais modesto, fosse um alto membro do politburo, subitamente caído em desgraça.
Um misto de lotaria e dum jogo da cabra-cega.

Generoso, o historiador pôs à disposição na sua página (http://www.orlandofiges.com/) fotografias, algumas escondidas durante décadas em gavetas falsas ou debaixo do soalho, relatos e videos, organizados por protagonistas do livro.

terça-feira, 28 de junho de 2011

OS NOSSOS BRÂMANES


Apesar de extinto oficialmente em 1950, a cultura hindu ainda não abandonou totalmente o sistema de castas na India.
Originalmente, as pessoas eram divididas em 4 grupos fechados (chegando a haver 3000 subcastas), de acordo com a sua posição social hereditária, que não podiam ser transpostos: os brâmanes (religiosos e letrados), os xatrias (guerreiros e governantes), os vaixias (proprietários agrícolas, comerciantes e artistas), e os sudras (servos camponeses, artesãos ou operários).  Os primeiros teriam nascido da cabeça do Brahma, os segundos dos braços, os terceiros das pernas, os quartos dos pés.
Fora do sistema sobravam os párias ou intocáveis, nascidos da poeira sob os pés do deus criador do universo, os adivasis (povos tribais) e os mechhas (estrangeiros).

Nós por cá também temos uma casta, endógena - embora o acesso seja permitido (sob convite, como no grémio), a permanência está garantida. São os políticos, aqueles que aparecem na televisão e milhares de outros incógnitos.
Para eles está reservado um mercado de trabalho exclusivo, imune a conjunturas económicas e distribuído mais ou menos independentemente da subcasta (partido). Pataca-a-mim, pataca-a-ti.
Esta casta está no topo da hierarquia, mas podia levar o cognome do grupo inferior hindu, os intocáveis.
Ora, o novo governo está cheio de independentes, mas abaixo de Secretário de Estado são "os do costume" e já está muita gente em campo, para manter ou ocupar largas centenas de lugares: por estes dias, devem haver um pico nas despesas em telemóvel (do serviço?) e restaurantes caros. Despesas de representação, certamente...
Uma coisa sei, há pessoas cuja profissão é dar uso à agenda telefónica.

Eu também fui almoçar, mas à fnac, com um amigo que está por dentro da política com minúscula. Apareceu um seu conhecido e a conversa acabou na "apanha dos tachos".
Contou ele que um secretário de Estado, dum ministério que não quis revelar, lhe contara que tinha tudo pronto para trocar um director qualquer, e que recebera 4 telefonemas, "de áreas políticas distintas" para mandar parar a substituição - o que sucedeu.
O meu amigo, reparando que me engasgara com o sumo, perguntou "Estavas à espera de quê? Vai-se a ver e é da opus dei."
Tá bem, já tenho idade para não ser ingénuo.
Mas ainda estou na idade dos porquês: não sei de o termo "mandar" foi usado, ou foi imaginação minha, mas o que faz um governante acatar ou ceder perante telefonemas, alguns deles de pessoas de outros partidos? Pode ser que, no ano seguinte, seja ele a fazer 'o' telefonema? Por ser da mesma casta?

segunda-feira, 27 de junho de 2011

TÁ UMA MENINA


A minha boneca acabou a primária há dias, e agora vai para o ciclo.
Podia escrever que o tempo passou numa penada, "que me lembro dela assim", afastando as mãos dois palmos. E não faltava à verdade.
Mas também podia escrever o contrário, passaram muitas coisas, muitas "viroses", muitos aniversários, muitas viagens, muitas T-shirts. A primeira sopa (começamos mal), a primeira palavra, o primeiro dente (vieram mais 27 de leite e uns 8 definitivos, sendo que metade de dois deles ficaram num poste que "veio contra ela"), o primeiro passo, a última fralda, a bicicleta sem rodas, a junção das letras, os patins, o karaté, o futebol, o cavalo, a natação, o ténis, a escola. Etcaetera.
Lembramo-nos mais facilmente da história do filho mais velho, por 2 razões: a história dos outros é sempre partilhada, e as suas primeiras coisas acontecem pela pela segunda vez.
Bem, não interessa para aqui o inventário. Acontece que a miúda teve direito a um canudo e uma cartola, por acabar a primária. E já vai na segunda, teve outra cartola quando "acabou" a creche - já me ultrapassou, e não fica por aqui: por este andar, e se tudo correr bem, ainda recebe uma cartola por acabar o ciclo, outra pelo secundário e mais duas na faculdade bolonhesa, pela licenciatura e pelo mestrado. Uma chapelada.
Muito precoce? Estamos a falar duma criança de 10 anos, prester a receber o seu primeiro telemóvel (não vá ficar incontactável na escola do outro lado da rua...), que nunca passou uma rua sem vigilância parental.

domingo, 26 de junho de 2011

GORBACHEV FOI FELIZ

Михаи́л Серге́евич Горбачёв ou Mikhail Serguéievich Gorbachev nasceu em 1931, aderiu ao PC aos 21 anos, casou e licenciou-se aos 22, tornou-se economista-agrónomo aos 35.
Em 1970 torna-se 1º secretário da agricultura, em 72 entra para o comité central, em 74 no soviete supremo e em 79 no politburo, à sombra do conterrâneo Yuri Andropov. Com a morte deste líder e do seu breve sucessor, Chernenko, ascendeu a secretário-geral do PCUS em 11.03.1985.
No congresso do ano seguinte, Gorby fez história anunciando a glasnost e a perestroika - transparência e reestruturação. Em 1988, renegou a doutrina Brejnev, admitindo a opção dos povos pela democracia e recusando dar cobertura aos líderes comunistas do bloco de leste, o que acelerou o corrupio de revoluções, como milho numa panela, poc-poc-poc.
Convicções porventura ancoradas em algumas viagens ao ocidente, a consciência do fiasco do regime, posto a nú durante o desastre de Chernobyl, o facto de ter como interlocutor  um cativante e distendido Reagan, tão capaz de engrossar a voz como de fazer compromissos, e cuja despesa militar não podia acompanhar, tudo isso explica a sua abertura.
Em Agosto de 91, ficou 3 dias em prisão domiciliária na sua dacha da Crimeia, durante um golpe de Estado que fracassou e donde emergiu um herói, Iéltsin, tornado líder de facto - depois de humilhações públicas, no dia de Natal, Gorby resignou e a bandeira soviética foi retirada do mastro.
Visto como coveiro do comunismo por um ocidente agradecido, Gorby não deixou boa memória nos russos: associado à crise económica e à depressão nacionalista, com a desagregação da URSS e satélites, teve menos de 1% nas presidenciais de 1996.

O Nobel da Paz de 1990 esteve esta semana no Minho, em Arcos de Valdevez, onde foi homenageado. Numa entrevista da RTP, a jornalista perguntou-lhe, num rescaldo dos 80 anos, se fora feliz.
Respondeu o estadista, "Os reformadores nunca ficam felizes" e respondeu o homem: "Sim, muitas vezes. apesar de ter sofrido muitas perdas. A maior alegria para mim e para a Raisa [falecida em 1999], foi termo-nos conhecido. Amávamo-nos, casámos e vivemos sempre lado a lado. Esta felicidade pessoal foi compensadora." Em idade para balanços, é o homem que conta.

Gorbachev foi, pelo menos, 15 vezes capa da Time. Uma espécie de powerpoint da sua meteórica passagem pelo poder.  

 Março 1985
 Setembro 1985
 Novembro 1985
 Dezembro 1985
 Outubro 1986
 Julho 1987
 Dezembro 1987
 Janeiro 1988
 Junho 1988
 Dezembro 1988
 Dezembro 1989
 Janeiro 1990
 Janeiro 1990
 Junho 1990
Novembro 1991

sábado, 25 de junho de 2011

O ANTÓNIO MARIA

Quando vamos à cata de caricaturas do século XIX, é impossível não dar de caras com o pasquim humorístico "O António Maria", uma espécie de antepassado d' O Inimigo Público. O título levou o nome próprio de Fontes Pereira de Melo, os desenhos têm a traça de Rafael Bordalo Pinheiro e a escrita o cunho de Guilherme de Azevedo e, depois, de Ramalho Urtigão.
Com circulação nos períodos 1879-1885 e 1891-1898, fundado e dirigido por RBP, prometeu fazer “em prosa e verso, á penna e a carvão, a silhouette da sociedade portugueza do ultimo quartel do seculo dezenove”, não havendo outro remédio "senão ser opposição declarada e franca aos governos, e opposição aberta e systematica ás opposições, o que não o impossibilita de ser amavel uns dias por outros".
O primeiro (e delicioso) número, depois do "estatuto editorial", traz a seguinte notícia:
"O governo n'este momento de crise, resolveu fazer um leilão de toda a mobília dos ministerios e comprar outra para seu uso.
A venda consta de:
Um lote de governadores civis com as molas pouco seguras.
Vários directores geraes de mogno para sala de jantar.
Alguns deputados e alcatifas.
Generaes de brigada retocados.
Um comissario de policia com algumas deteriorações.
Um par do reino de coiro com o fundo um pouco usado.
E o competente serviço de cosinha, composto de caçarolas, amanuenses, panellas, chefes de repartição, frigideiras, moços fidalgos, barris do lixo, economias, etc."

Por milagre da tecnologia, todas as edições estão disponíveis para consulta pelos mais bisbilhoteiros (http://hemerotecadigital.cm-lisboa.pt/Periodicos/OAntonioMaria/OAntonioMaria.htm.













APOIADO


AS ELEIÇÕES SERVEM PARA
DEVOLVER O PODER AO POVO,
NÃO PARA PERMITIR
O ROTATIVISMO DAS CLIENTELAS.

Cavaco Silva, tomada de posse do governo de Passos Coelho, 21.6.2011

Bem a propósito, o Expresso de hoje conta que as estruturas do PSD já têm listas de boys a nomear, e atribuí à líder do CDS-Beja, Sílvia Ramos (fora com ela!), a frase "este é o momento de se correr atrás de lugares".
Uma longa pateada.

sexta-feira, 24 de junho de 2011

RESCALDO


HÁ DERROTAS CARREGADAS DE FUTURO
Miguel Relvas

O Cardeal-patriarca de Lisboa, dom Policarpo, disse não ser doutrinalmente contra o sacerdócio das mulheres, mas que isso aconteceria "quando Deus quiser". Calha bem acreditar na providência divina, mas se ele e outros como ele não mexerem no assunto, é o mesmo que atirar o problema para as calendas gregas - não havendo calendas no calendário grego, é uma espécie de dia de são nunca à tarde.

Já Louçã não pode invocar a intervenção divina, e empurrar problemas com a barriga.
Mas é isso que o BE tem feito na digestão do fiasco eleitoral, quando um eurodeputado abandona a bancada, Portas e Cª pedem a saída dos fundadores, a ala direita (cruzes credo) critica a táctica de mimetismo do PC e a ala esquerda da ruptura-FER (sigla arrepiante que ainda inclui a palavra 'revolucionária') pede uma convenção: agora far-se-á um debate interno, logo se vê se o congresso é antecipado.
Maus ventos para aquela banda: o problema não se resume a falhas como a balda à troika, a incógnita é o futuro. Manter uma direcção cristalizada ideologicamente (Louçã é líder há 40 anos, ininterruptamente), ou renovar? Manter a recusa de pontes com um PS 'pecador' porque pragmático, ou ser "o CDS à esquerda", como bem colocou João Teixeira Lopes? Sabem a minha opinião, é preferível influenciar um governo fazendo parte dele, mesmo engolindo propostas alheias, do que vetando projectos na AR.
Enquanto o partido cresceu, os críticos calavam ou falavam baixinho, ao primeiro trambolhão cai a máscara: uma holding mal colada de facções e tiques autocráticos, por vezes lembrando as acusações de desvios burgueses de antanho.

Para os lados do PS, a leveza do ser: Sócrates foi eleito há meses com uma votação esmagadora, à albanesa. Hoje, o seu único quase-crítico, António José Seguro, arrebanha as hostes socráticas: 15 direcções das 18 federações, 2/3 dos presidentes de câmaras socialistas, Alberto Martins, António Serrano, Renato Sampaio, Luís Bernardo,...

quinta-feira, 23 de junho de 2011

MÁSCARAS DE VENEZA

O Carnaval de Veneza está para o do Rio, como um Maybach para um Porshe.
Há que aponte o aparecimento desta festa para 1094, quando o Doge instituiu a festança do carnis laxatio (abandono da carne), ou para o decreto de feriado na 3ª feira antes da quaresma em 1296; outros indicam 1162, na 6ª feira gorda, para festejar uma vitória militar; outros ainda defendem o ano de 1268, quando é pela primeira vez documentado o uso de máscaras - nesse édito, foi proibido o "jogo dos ovos". 
No século XIV, a festa sofreu um efeito 'duracell': começava em Outubro, coincidindo com o início da época teatral, parava no advento (4 semanas antes do Natal), recomeçava a 26 de Dezembro e só acabava na 3º feira antes da quaresma.
E, para um bom regabofe, nada como o anonimato dos trajes e das máscaras. A ponto de, nesse século, ser proibido o uso de máscaras à noite, em conventos e igrejas, por causa das "imoralidades" (a pena de multa e prisão até 2 anos não demoveu todos, mesmo fora das festas) e, em 1608, ser declarado que as máscaras eram uma ameaça à república sereníssima. É que, está bom de ver, as gentes aproveitavam os disfarces para o jogo, assassínios, adultério e sedução de donzelas e noviças.
Ganhou tradição no século XVII, quando a nobreza descia dos salões e se misturava como o povão, no meio de saltimbancos, animais amestrados, músicos, marionetas e actores, em particular da commedia dell'arte - do Arlechino, Columbina & Cª.
Suspenso em 1797 (quando a cidade foi integrada no império de Napoleão), só reapareceu oficialmente em 1979.
Algumas máscaras ganharam fama, como a bauta (meia-máscara, que permite comer e beber), a feminina moretta (presa pelos dentes, o que impedia as damas de abrir a boca) ou a mattaccino dos atiradores de ovos - que resistiram à proibição. Os materiais, papel maché, seda ou couro.
Os tradicionalistas usam as mashera nobile (brancas), um traje de seda negra e tricórnio. Outros escondem-se com máscaras prateadas ou douradas e trajes oitocentistas. E outros ainda são criativos e arriscam modernices. Mas a "macedónia" é rica e elegante. São 10 dias de festas e desfiles, num cenário magnífico e inigualável.
Convenhamos, tem patine.