Sempre que via a minha filha bebé, o eminente cartaxense Sr. Pina (ainda não era avô) sorria e dizia “coitadinha”. Quando lhe perguntei porque a tratava assim, respondeu “porque é tão pequenina”. Devia ser porque era indefesa, penso, mas a miúda era plenamente realizada, tinha apenas 3 necessidades: calor q.b., barriga cheia e fralda limpa.
Agora os problemas existenciais das minhas crianças resumem-se à emergência de mais um strumpf para a colecção ou dum jogo da play station, ou a injustiça de se deitarem à hora de dormir. Não sabem o que significa crude, inflação ou condomínio, nem conhecem a palavra hipoteca.
Chegado a Agosto, sou particularmente assaltado pela inveja: os miúdos ainda têm AS FÉRIAS GRANDES. Quem não tem saudades de 3 meses inteirinhos de férias, de brincar o dia todo na rua e saltar o muro para a quinta do lado, da semana em S. Martinho (sem pais), das jogatanas de Risco ou de computador, dos banhos no tanque dum amigo, das festas na garagem, das amêijoas da Cristina com o Quo Vadis fechado, das idas à Horta (esta parte, adianto aqui, não eram as minhas preferidas), das directas - agora, 5.15 são horas de sair, não de chegar. 13 semanas seguidas – e picos – sem compromissos ou horários.
Coitadinhas as crianças? Coitadinhos???
E agora, para algo completamente diferente, Feeeernando Pessooooa:
Ai que prazer
Não cumprir um dever,
Ter um livro para ler
E não o fazer!
Ler é maçada,
Estudar é nada.
O sol doira
Sem literatura.
O rio corre, bem ou mal,
Sem edição original.
E a brisa, essa,
De tão naturalmente matinal,
Como tem tempo não tem pressa...
Livros são papéis pintados com tinta.
Estudar é uma coisa em que está indistinta
A distinção entre nada e coisa nenhuma.
Quanto é melhor, quanto há bruma,
Esperar por D. Sebastião,
Quer venha ou não!
Grande é a poesia, a bondade e as danças...
Mas o melhor do mundo são as crianças,
Flores, música, o luar, e o sol, que peca
Só quando, em vez de criar, seca.
O mais que isto
É Jesus Cristo,
Que não sabia nada de finanças
Nem consta que tivesse biblioteca...
Pode crer, Luis Duarte. Isso é que eram férias grandes. E com os filhos lembramo-nos ainda mais delas.
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