quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

FILHOS E CADILHOS

Ter um filho ingrato é mais doloroso
do que a mordedura de uma serpente!
William Shakespeare, Rei Lear 

Volta-não-volta, digo aos meus herdeiros pedinchões 'Tanta coisa e, no fim, pões-me num lar'. Na brincadeira (espero), mas há quem se queixe de ingratidão e, entre eles, a quem saiu A fava.
Cruzei-me há dias com um senhor que tem 5 filhos. Perguntei-lhe por um deles, que já não via há meses:
- Ah, esse não tem estado por aqui, só vem buscar o ordenado. Ele e a irmã são uns bandidos, roubaram-me uns milhares largos - uma pessoa cria os filhos e depois é assim que eles agradecem. O único que presta é o mais velho.
- Mas não foi esse que, há uns anos, lhe quis bater?
- Foi, tentou-me [es]faquear. Mas a gente perdoa tudo aos filhos...
A esse filho pródigo, ouvi eu tratar o pai por 'o velho', com um esgar nada carinhoso. Há pouco tempo.
Parece estória de novela, mas tristemente não é.
Alguém imagina, quando vê um bebé indefeso pela primeira vez, ou uma criança a aninhar-se no seu colo, com medo do escuro, que a vida seja uma implacável betoneira e esse filho se torne num bandido - como uma folha alva e imaculada que começa a ser preenchida com um b-a-ba ternurento e certinho e acaba cheia de gatafunhos furiosos.
Acresce, o que não é de somenos, a dilacerante dúvida do desafortunado progenitor - se, por erro ou omissão, no todo ou em parte, contribuiu para essa metamorfose.

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