"Para certos republicanos a República tem sido um pé de cabra com que vêem aumentando os seus haveres." Senador João de Freitas, histórico republicano, in Boletim parlamentar do Senado, 11-06-1913
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terça-feira, 29 de novembro de 2011
O CONDE DE ABRANHOS
O Conde d' Abranhos é aquele livro de Eça conhecido pela expressão "Este governo não há-de cair - porque não é um edifício. Tem de sair com benzina, - porque é uma nódoa!".
O livro (que já aqui apareceu, à conta do conselheiro Gama Torres) é um ensaio de ironia sobre a política, na forma duma biográfica elegia do secretário do Abranhos, 'no desejo de glorificar a memória deste varão eminente, Orador, Publicista, Estadista, Legislador e Filósofo'.
Alípio Abranhos é aquele que bajulou os professores e depois o padre para conquistar a futura sogra, é aquele que saltou para a bancada da oposição quando previu que o governo estava por meses (o que Winston Churchill fez uns anos depois!), é aquele que um dia exclamou na Câmara dos Deputados 'Não podemos dar ao operário o pão na terra, mas, obrigando-o a cultivar a fé, preparamos-lhe no Céu banquetes de Luz e de Bem-aventurança'.
O deputado Abranhos é aquele cujas ideias tão perfeitas, como o encarceramento dos pobres ('tendo a certeza de que os seus pobres lá estão, bem aferrolhados, com uma razoável enxerga e um caldo diário'), não passaram nas Câmaras por motivos mesquinhos.
O filósofo Abranhos é aquele que via o povo 'como um desses monstruosos elefantes da Índia de que tenho ouvido contar: de uma pujança indomável e de uma simplicidade risível, o mundo inteiro, pela violência, não o pode obrigar a caminhar contra sua vontade, e uma criança, pela astúcia, obriga-o a cabriolas grotescas (...) Para que se há-de combater um monstro invencível, quando é simples iludí-lo?'
O Conde d'Abranhos é aquele exemplo de modéstia, quanto à elevação dos seus poemas: '- Enfim, são rapaziadas. Todos nós, mais ou menos, em rapazes, fomos poetas e republicanos... Antes isso que andar a beberricar genebra nos botequins e frequentar meretrizes... Mas, quando se entra na verdadeira vida política, é necessário por de lado esses sentimentos ternos...'
O Ministro Abranhos é o Estadista não reconhecido pela pequenez nacional:
'Disse-se, por exemplo, que só depois de dezoito meses de ministro [da Marinha e Ultramar] é que soube, por acaso, onde ficava Timor! (...) - o que prova isso, senão que a sua vasta inteligência, toda voltada para os altos problemas políticos, não dava valor a essas pequenas ciências de exactidão local?'
E a quem o corrigiu na Câmara, gritando que Moçambique não ficava na costa ocidental de África, respondeu:
'- Que fique na costa ocidental ou na costa oriental, nada tira a que seja a doutrina que estabeleço. Os regulamentos não mudam com as latitudes!'
Esta réplica vem mais uma vez provar que o Conde se ocupava sobretudo de ideias gerais, dignas do seu grande espírito, e não se demorava nesse verificação microscópica de detalhes práticos, que preocupam os espíritos subalternos.'
São pequenos teasers, mas dá ou não dá vontade de ler o resto?
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