Meu bom Costa:
As suas missivas são um bálsamo, como o são para a mamã, que agradece a sua estima (a infeliz recupera duma queda, a sair da sege). Fazem ganhar o dia, a ponto de olvidar a pieira que me atormenta – cada dia menos, pour cause dos ares puríssimos da Helvécia.
Vou tendo novas da pátria pelo meu administrador do Pinhão (cartas enfadonhas de deve e haver) e pelo Comendador Acácio, cujos dilemas mundanos são uma piléria, mas sempre manda o Século (quando chega, vem velho, fala num governo que já caiu).
As suas missivas são um bálsamo, como o são para a mamã, que agradece a sua estima (a infeliz recupera duma queda, a sair da sege). Fazem ganhar o dia, a ponto de olvidar a pieira que me atormenta – cada dia menos, pour cause dos ares puríssimos da Helvécia.
Vou tendo novas da pátria pelo meu administrador do Pinhão (cartas enfadonhas de deve e haver) e pelo Comendador Acácio, cujos dilemas mundanos são uma piléria, mas sempre manda o Século (quando chega, vem velho, fala num governo que já caiu).
Estar longe lava a memória, ficam só as boas lembranças da terra de Camões – cheguei a salivar ao saber do azeite luso que unta a sua casa de pasto.
Quanto às suas palavras, ânimo, homem, há que ser positivo. Bem sei que Portugal tem um decadente ar de fin de siécle, mas o amigo parece um tanto desiludido.
Quanto às suas palavras, ânimo, homem, há que ser positivo. Bem sei que Portugal tem um decadente ar de fin de siécle, mas o amigo parece um tanto desiludido.
Devia apresentá-lo ao Ramalho Ortigão, ele faz parte dum grupo jantante, os “Vencidos da Vida”, desiludidos com a Regeneração e depois com El-Rey, onde depositaram confiança. Aquelas opíparas reuniões no Tavares são um regalo, acredite.
A sua carta fez-me recordar 2 versos do Lopes de Mendonça e do Keil, primeiro “Contra os Bretões, marchar, marchar”, pois não suporto ralhetes desses bárbaros cheios de prosápia, e “Levantai, hoje de novo, o esplendor de Portugal”.
A minha marcha pela Europa avivou o meu republicanismo.
A sua carta fez-me recordar 2 versos do Lopes de Mendonça e do Keil, primeiro “Contra os Bretões, marchar, marchar”, pois não suporto ralhetes desses bárbaros cheios de prosápia, e “Levantai, hoje de novo, o esplendor de Portugal”.
A minha marcha pela Europa avivou o meu republicanismo.
O problema não é a piolheira, como lhe chamou El-Rey, nem um povo iletrado e passivo, o problema é o próprio rei, que caça em Vila Viçosa ou desenha peixinhos no iate Amélia, enquanto o país “mareia”.
Fim aos Braganças e venha a República!
Vai ver, meu prezado Costa, como acaba a justiça penhorada ao poder, o caciquismo, os projectos megalómanos e os gastos sumptuosos enquanto o povo asfixia, os deputados que oferecem entre si bengaladas na assembleia e charutos na Brazileira, os políticos que não sabem fazer mais nada na vida, como traças em torno do poder, a censura, a sucessão de governos tão rápida que torna impossível enumerá-los. E a gamela partilhada por 2 partidos, como dois velhos gordos de cartola, guardanapo ao peito e bigodes lambuzados.
Venha a República e a nação será conduzida por homens bons, motivados apenas pelo interesse público. E, creia, quando chegar ao século XXI, Portugal não estará penhorado, mas na vanguarda da Europa.
Vai ver, meu prezado Costa, como acaba a justiça penhorada ao poder, o caciquismo, os projectos megalómanos e os gastos sumptuosos enquanto o povo asfixia, os deputados que oferecem entre si bengaladas na assembleia e charutos na Brazileira, os políticos que não sabem fazer mais nada na vida, como traças em torno do poder, a censura, a sucessão de governos tão rápida que torna impossível enumerá-los. E a gamela partilhada por 2 partidos, como dois velhos gordos de cartola, guardanapo ao peito e bigodes lambuzados.
Venha a República e a nação será conduzida por homens bons, motivados apenas pelo interesse público. E, creia, quando chegar ao século XXI, Portugal não estará penhorado, mas na vanguarda da Europa.
E há ainda que não esquecer as colónias, tão pouco aproveitadas, dando azo a que nos roubassem o mapa cor de rosa. Chegou a hora de ir para Angola, rapidamente e em força.
Termino a minha prosa voltando ao hymno republicano, “Desfralda a invicta bandeira, À luz viva do teu céo!, Brade a Europa à terra inteira: Portugal não pereceu.”
Termino a minha prosa voltando ao hymno republicano, “Desfralda a invicta bandeira, À luz viva do teu céo!, Brade a Europa à terra inteira: Portugal não pereceu.”
Guarde lá um Colares para mim, que devo chegar em Março. Não sem antes escrever-lhe de Marselha, onde contamos apanhar o paquete para recolher à Pátria.
Creia-me honrado por tê-lo e à D. Sophia como amigos.
Seu, Bernardo Saraiva
Creia-me honrado por tê-lo e à D. Sophia como amigos.
Seu, Bernardo Saraiva
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