terça-feira, 8 de abril de 2014

REWIND

Newsies at Skeeter Branch, St. Louis. Lewis Hine, 1910

20-vinte-20 anos. Há quanto tempo não se viam.
E tinham sido tão amigos, daqueles inseparáveis, siameses. Durante anos seguidos, milhares de tardes e de noites. A história de um era a história do outro, as brincadeiras, as bebedeiras, os matrecos, as noitadas, os desamores.
Chegou o dia em que a geografia os apartou. Foram-se encontrando, a intervalos crescentes - mas era como se tivessem estado juntos na véspera -, até que nunca mais se viram. Houve ainda uns telefonemas no Natal, uma chamada para celebrar a paternidade de fresco, outra por um motivo esquecido, e pronto.
Até que, um dia, veio uma chamada: 'Vou aí no Sábado, jantamos?'
O entusiamo infantil foi atravessado pela dúvida: Como pôr em dia 20 anos? Como encher 2 horas, depois de mostrar a família no telemóvel, resumir o currículo e falar do divórcio duns amigos em comum? Tanta quilometragem no contador, já não eram os catraios de outrora, seriam estranhos ou, pelo menos, alheios um ao outro?
O abraço foi apertado, tanto quanto permitiam as suas barrigas, cadastros do tempo.
- Então, pá? Como é que estás?
- Tirando o fútil, tornei-me no pesadelo do Álvaro de Campos: casado, quotidiano e tributável*. E tu?
- Nã. Quero saber tudo, tim-tim por tim-tim. Comecemos por 1995.
Nesse dia, voltaram atrás no tempo, e a história de um voltou a ser a história do outro.
Também partilharam a ressaca, pois os fígados já não eram os mesmos.

* Lisbon Revisited, 1923

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