sexta-feira, 7 de março de 2014

PORTUGAL É NOSSO!?

Carte des Royaumes de Congo, Angola et Benguela Avec les Pays Voisins. 1754, Jacques Bellin
'A maior desgraça de uma nação pobre é que em vez
de produzir riqueza, produz ricos.' Mia Couto

Não me passava pela cabeça vir a comprar um livro escrito a seis mãos, sendo duas delas as de Francisco Louçã. Explicação, tirando uns parágrafos com uma prosa mais ideológica, podia ser escrito por Paulo Morais, José Gomes Ferreira ou qualquer jornalista paciente... que não trabalhe no Sol, no I, na Sábado, no Correio da Manhã, no Jornal de Negócios, no JN, no DN, no Record, n' O Jogo ou na TSF - publicações com accionistas angolanos (sobra a Impresa, onde já têm um pézinho de 3,21%, e o Público de Belmiro, agora agarrado a Isabel dos Santos na Zon-Optimus e no Continente Angola).
Não que 'Os donos angolanos de Portugal' traga alguma cacha, 'apenas' desfaz longas meadas dum intrincado novelo, identificando os donos do dinheiro angolano e os seus interlocutores lusitanos.
Não é que sejam muitos, dum lado ou de outro: do lado de lá, a família e a corte restrita de José Eduardo dos Santos, com generais, brigadeiros, membros das suas casas civil e militar, vice-presidentes e ministros em funções; do lado de cá, a banca, umas dezenas endogâmicas de políticos contratados para a constelação empresarial luso-angolana (assim como o procurador do DCIAP responsável por inquéritos relacionados com Angola...) e grandes empresários* que precisam de financiamento ou querem instalar-se em Angola e têm que oferecer metade do negócio a 'parceiros' locais - não é preciso escolher muito, é um número reduzido.
Já a entrada em bancos, petrolíferas, jornais, a editora Babel, conserveiras (Bom Petisco e Pitéu), quintas vinícolas, clubes de futebol (o Sporting e os 2 Vitórias), empresas de telecomunicações, o terminal portuário de Setúbal, construtoras, cerâmicas (pobre Viúva Lamego) e no estúdio da Tobis, deve-se ao enriquecimento alquímico**: que fazer aos muitos milhões gerados por Santos & associados (nas palavras do PR, uma 'acumulação primitiva de capital' que deve ser adequada à realidade africana), precavendo a hipótese do poder político fugir de controlo, quanto Santos arrumar as botas? Não basta empilhá-los num cofre, as contas bancárias podem sempre ser congeladas. Procure-se um país carente de capital, arranjam-se umas pechinchas (que ainda conferem alguma respeitabilidade), a fortuna é reciclada/legitimada e o pé-de-meia está protegido.
Não sei qual o termo adequado, cleptocracia, oligarquia ou partidocracia. Certo é que a leitura é um pouco nauseante, e faz lembrar aquela história do 'parece m..., cheira a m..., sabe a m..., ainda bem que não pisei'.
Lê-se numa penada.

* O mais calejado é Américo Amorim, que tem uma receita infalível, é sócio da filha do PR angolano no BIC, e partilha o Banco Único com o filho do PR moçambicano.
** Exemplo de contas esquisitas: diz o FMI que, entre janeiro e outubro de 2011, apenas 1/4 dos lucros da Sonangol (a nave-mãe) entrou no tesouro angolano, o destino do resto teve uma explicação tão sumária quanto insuficiente. 
  









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