domingo, 19 de maio de 2013

TUDO BEM, SE NÃO FOR COMIGO


A ELITE DO PAÍS 'NIMBY'
Henrique Monteiro, Expresso online, 17.05.2013

Vi ontem uma pequena reportagem com a Comunidade Vida e Paz, uma associação generosa, voluntária e desprendida que todas as noites distribui alimentos. Há muito que o faz, muito antes da crise, sem esperar qualquer reconhecimento, com poucas palavras, pouco protagonismo e muitas ações. Qual a novidade? Cada vez mais pessoas recorrem à ajuda alimentar levando os seus filhos, apesar de noite cerrada, porque são os pequenos quem mais necessita urgentemente de comida.
Penso que nem uma pedra fica indiferente a uma situação destas. E se a trago aqui é porque tenho a sensação de que a elite deste país é especialista no que em inglês se chama NIMBY (de Not In My Back Yard, ou não no meu quintal). Ou seja, a nossa elite, que tem acesso à comunicação, raramente fala do problema dos outros, preferindo falar dos seus. Sendo uma elite que largamente vive de reformas, fala de reformas; sendo uma elite que largamente vive do setor público, fala do setor público. Sendo uma elite que vive largamente à sombra do Estado, fala do Estado. É, por isso também largamente favorável a todo o tipo de reformas, desde que elas não atinjam o seu quintal - não no meu quintal, NIMBY.
Mas o maior problema do país não é se 10% dos reformados vai ganhar menos, ou se os professores vão trabalhar mais cinco horas. Se olharmos para estes dramas concretos que se vivem à volta de organizações como a Comunidade Vida e Paz, se recordarmos os 19, 20, ou mais por cento de desempregados, os velhos com reformas miseráveis (daquelas que não foram sequer cortadas), as famílias desestruturadas pela crise, rapidamente vemos o ridículo de um país que nunca discute estes casos no concreto, mas apenas em esquemas macroeconómicos tão manhosos como as folhas de Excel.
A questão que se coloca a cada um é o que faremos por este país? Estamos dispostos a dar? Queremos ajudar? Como podemos ajudar? Partamos deste ponto para todos os debates. O 'NIMBY' é a marca da imobilidade que nos conduziu até onde estamos.

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