"Para certos republicanos a República tem sido um pé de cabra com que vêem aumentando os seus haveres." Senador João de Freitas, histórico republicano, in Boletim parlamentar do Senado, 11-06-1913
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terça-feira, 14 de junho de 2011
UMA GOTA DE ÁGUA
Ele há coisas que não se entende. Durante anos, um povo vai elegendo pessoas a contas com a justiça, cuja honestidade está maculada de dúvidas... até que um dia, como uma gota a mais num copo cheio, se fartam.
Por cá tivemos Fátima Felgueiras: fugiu para o Brasil quando um espírito-santo-de-orelha lhe segredou que ia ser presa, voltou a tempo de se recandidatar e ganhou, sem o apoio do seu partido - o que, na altura, valeu porrada ao agora candidato Assis.
Vinte e tal acusações no tribunal (foram caindo ao longo dos anos, bem à portuguesa) não chegaram para os felgueirenses acreditarem em sacos azuis, negociatas e peculatos, ou acharem que isso tinha importância. Mas, na eleição seguinte, plim, deram maioria absoluta ao partido da oposição.
Mais estranho é o que se passa em Itália.
Berlusconi fez aprovar leis que reduzem os prazos de prescrição e outras quase ad hominem para lhe garantirem a imunidade em vários de enriquecimento ilícito, corrupção, luvas, abuso de poder, falsos testemunhos, fraude fiscal e sobrefacturação de direitos de emissões televisivas do seu grupo Mediaset.
Com a mesma costela grosseira de Alberto João, proclamava uma cabala de juízes "vermelhos", que queriam tirá-lo do lugar onde os italianos o puseram, e prometeu uma CPI para averiguar se na magistratura (que disse ser o cancro da democracia) existe uma associação criminal e com objectivos subsersivos.
Mas o povo da bota foi-lhe renovando a maioria, como se nada passasse, ignorando (ou apreciando a virilidade do ancião) as alegadas orgias e falcatruas.
Até agora: há dias, Il Cavaliere sofreu uma humilhação nas autárquicas, perdendo os seus bastiões de sempre no norte; ontem, no único referendo vinculativo dos últimos 18 anos (Berlusconi apelou à abstenção, para que tal não sucedesse), 57% dos eleitores foram votar e 95% recusou a hipótese de Berlusconi continuar a baldar-se ao tribunal, alegando afazeres governativos - a passar, teria o cínico nome de "lei do legítimo impedimento".
Da mesma forma que lemos na imprensa estrangeira retratos redutores (quando não errados) da realidade portuguesa, é possível que os italianos vejam razões para votar nele, seja por causa duma oposição (até agora) esfrangalhada, seja por acreditarem que um homem bem sucedido na vida serve para o lugar,...
Algo aconteceu para o povo se fartar subitamente de Berlusconi. Uma das razões pode ter a ver com a igreja, que passou a reprovar a conduta do PM, no caso do sexo, entre outras, com a menor (embora não pareça) Ruby. Uma razão pouco abonatória, esperar que a igreja vire o polegar para baixo.
Como mirone pouco informado, espero que o egocêntrico cantor de cruzeiros (só um egocêntrico acredita que passa impune, ligando à polícia para soltar a prostituta adolescente, inventando que seria sobrinha de Mubarak) seja punido - se for culpado, no palácio da Justiça, e de qualquer forma nas urnas.
Em todo o caso, se fosse italiano, eu teria vergonha do meu PM.
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