domingo, 3 de janeiro de 2010

O TIRO PELA CULATRA


D. MANUEL foi o rei dos impossíveis. Não estava calhado para reinar, não fosse Afonso, o único filho do príncipe perfeito D. João II, ter caído do cavalo em Almeirim e morrido (é das únicas cenas que me lembro de “Non ou a vanglória de mandar” de Oliveira, a par duma conversa entre militares, num camião no Ultramar, com o Manuel Guilherme).
Morto D. João II, o primo-direito/cunhado Manuel chega ao trono no apogeu da ciência náutica portuguesa, com a chegada à Índia e ao Brasil.

Mas ele quis mais, quis Espanha*. Viu a oportunidade quando morreu o único varão dos Reis Católicos.
Vai daí, casou com Isabel, viúva do tal Afonso e filha mais velha da (prima-direita) Isabel a Católica: a mulher morreu de parto, mas o filho Miguel da Paz foi jurado herdeiro de Castela, Leão, Aragão e Portugal. Azar, morreu aos 2 anos.
Esteve quase.
Manuel insistiu e casou com a cunhada/prima Maria, que lhe deu novo herdeiro (João III), mas só de Portugal.
Morta Maria, Manuel casou com Leonor, sobrinha da falecida e filha de Joana a Louca, então herdeira de Espanha: como a noiva já estava prometida a seu filho (também o inglês Henrique VII quis casar com a nora viúva e Filipe II de Espanha roubou a noiva ao filho), o infante teve que casar com a irmã da nova madrasta, Catarina da Áustria.

Manuel teve 11 filhos, suficiente para manter a coroa independente. O filho João III deu-lhe 8 netos, 5 morreram crianças, 1 não sei o destino, sobrou Maria e João, que morreu novo sem reinar e deixou um filho. Esse bisneto de Manuel chamava-se Sebastião e morreu (?) em Alcácer-Quibir… só com uma tia paterna, casada com um Habsburgo.
A mistura com Espanha foi tão forçada que apareceu o pretendente Filipe II, neto, sobrinho e sobrinho-neto de Manuel, genro e sobrinho (pela mãe e pelo pai) de João III, tio materno e por afinidade de Sebastião. Entregou-se o ouro ao bandido.

Mas e se Miguel da Paz crescesse e viesse a reinar? Havia uma cláusula que garantia que os cargos nacionais permaneciam em mãos de portugueses, mas não acabaríamos todos espanhóis?

* Houve anos antes uma tentativa menos diplomática de anexar Castela. O pai de João II, Afonso V, casara com a sobrinha Joana a Beltraneja, herdeira de Castela, e lutara pelo seu trono. Mas Isabel a Católica fez-se coroar em Segóvia, alegando que o falecido meio-irmão (Henrique IV) era impotente e que a sobrinha Joana era filha da cunhada adúltera Joana de Portugal e do cortesão D. Beltrão.

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