...e depois, com bigodes de leite, pedem mais paciência e esforço ao povo, que a "vaca 'tá seca".

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

FOI ASSIM, FOI


Somos uma geração privilegiada. Durante séculos, as pessoas viveram como os seus tetravós, mas o mundo acelerou e nós vimos mudar muita coisa.

Eu ainda sou do tempo do autocarro verde de 2 andares e de haver um só canal a preto e branco (lembro-me de ficar frente a um ecrãn com grão, à espera da abertura da emissão) – o "Marco" que nunca encontrava a mãe por uma nesguinha (foste embora mamã, não me deixes aqui!) era considerado violento, havia 1 só novela, às 3ª havia entrevista, às 4ª havia filmes, e eu via mais televisão.
Víamos mais televisão, mas - PERIGO!!! - passávamos a vida na rua, até ficar escuro, onde partíamos a cabeça a correr em tábuas com rolamentos "home made" ou saltávamos à fogueira - sem que os nossos pais fossem apelidados de incompetentes.
Sou do tempo de vintages como os LP a 45 e 71 rotações, do zx spectrum que se usava com uma cassete barulhenta (quantas vezes falhava a entrar...), das bonecas espanholas de perna aberta colocada na cama. E o menino da lágrima era um must, a fazer pendant com o vidro às cores que se punha frente ao televisor, para colorir a imagem.
Havia uma só auto-estrada no país, entre Lisboa e Porto, mas não chegava lá. Faltavam anos para a via verde, claro.
Não havia Multibanco e tínhamos que trocar dinheiro no banco para ir a Badajoz, e voltar ao banco para converter a sobra de pesetas – com comissões.
Os trabalhos da escola obrigavam a ir à biblioteca ou, luxo, recorrer à enciclopédia luso-brasileira do pai. Agora está à distância dum clique, tudo o que se quiser saber, haja sorte e capacidade de seleccionar as fontes.
Tiravam-se cursos para saber usar uma máquina de escrever, a duas cores, com papel químico para fazer cópias, sem corrector de erros, e rezávamos para não nos enganarmos em nenhuma letra.
Não havia multiplexes, as salas de cinema eram grandes e as pessoas envolviam-se na história: no Cinema do Cartaxo, quando o Rambo IV deu cabo do russo, houve uma salva de palmas.
Se recuar mais, as fraldas eram de pano, a maioria das fotos era a preto-e-branco (mães mais jeitosas pintavam-as), fotografias rápidas eram polaróides, desfocadas e irreproduzíveis.
A anos-luz da rotundomania, havia poucos carros no Cartaxo e mulheres ao volante eram uma raridade.
Antes da febre dos relógios digitais, os relógios eram umas cebolas que mudavam a cor com a direcção da luz.
E um maço de Kentucky custava 4 escudos.

Agora há de tudo um pouco. É difícil de explicar aos miúdos que houve um mundo em que os produtos eram chamados pelo nome duma marca, porque era a única: ajax para os vidros, vim para o chão, forza para o forno, pirata ou gorila para as pastilhas, viarco para lápis (com tabuada impressa), gillette para as lâminas da barba, yoplait ou vigor para iogurtes (tam'ém se faziam em casa), laranjina para laranjada, Majora para jogos, nívea para o protector solar ou bronzeador (ninguém falava em cancro da pele), o boca-doce para os pudins, savora para mostarda. Vick era sinónimo de descongestionante nasal, esfregado no peito, e comia-se pão com chocolate, o Comacompão ou coisa assim.
E, finalmente, a minha preferida, batata frita era pala-pala.
 



8 comentários:

  1. Apesar de ser mais novo, também sou do tempo dos vintages. O meu pai trouxe de Angola uma mala cheia de singles em 45 rotações de música francesa e ainda tenho a aparelhagem Philips, com logo antigo, com o prato de vinyl revestido em madeira, que tocou muitos discos. Não tive o ZX Spectrum, mas sim o Timex 2048K, com gravador/leitor de cassetes Crown (e fazia muito barulho, sim senhora. Quanto mais agudo melhor.). Também tive os erros de TAPE LOADING ERROR no televisor, ao fim de uma hora de carregamento de jogo. Soube há pouco tempo que a minha mãe ao fazer uma limpeza da cave, deitou o Timex para o lixo sem perguntar...Na primeira casa que vivi, tinha o quadro do menino da lágrima na sala a olhar para mim.
    Agora os miúdos conhecem outras marcas: iPOD, NOKIA, hi5, facebook, falando só em tecnologia.
    PS: o pão com chocolate para mim era o Tulicreme de chocolate(depois apareceu avelã) nas duas metades do pão com uma fatia de marmelada!!!! Sou um lambão!

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  2. Pois foi.
    As mães lavavam as fraldas dos filhos à mão, no tanque de lavar roupa. Agora usam fraldas descartáveis mesmo tendo máquina de lavar roupa.
    Calçávamos ténis, sem saber que Ténis era uma marca de sapatilhas, e quem gostava, comia pão com Tulicreme.
    Tinhamos uma forte influencia de vocabulário francês e assim chamava-se garçon ao empregado da esplanada enquanto as meninas aprendiam o tricot e o macramé na revista Lavores, fazendo da marquise um atelier com a luz suave do abajour.
    Agora, temos uns parvos que se dizem low profile sem se lembrarem que faziam melhor figura e davam menos nas vistas, se fossem apenas discretos.

    Abraço Luís Duarte. Gosto muito de ter ler.

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  3. Perdi-me no último parágrafo. Aqui que ninguém nos ouve, quem são esses espalha-brasas pretensiosos que não deviam dar nas vistas?
    Conta lá as tuas "apoquentações".

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  4. Não tenho "apoquentações" e não tenhas tu também, que não fazes parte destes espalha-brasas que dizem: «-Ah! Eu cá sou muito low-profile...». E não é por serem pretensiosos. É porque está na moda dizer 'low profile',termo que se aplica a políticos e dirigentes que evitam os 'mass media' ou média.(salvo-erro).
    Quem não é figura-publica, o mais que pode ser, se quiser, é discreto.

    Outra moda que nos pode fazer pretensiosos, é aquela de começar as frases ou os discursos com: «-É assim:...», como se o que temos a dizer, só pudesse ser assim e mais nada. E há quem abuse do 'é assim' para falar, como de uma muleta para andar. Comparativamente falando.
    São modas passageiras, como a de eskrever axim... Espero!

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  5. caro Luís. Este saudosismo faz-me sempre sorrir. Porque foram bons tempos e porque nos permite ter óptima comparação nestes tempos em que parecemos ter tudo mas acabamos por ter bem menos do que verdadeiramente interessa. Quanto a memórias cresci com legos e pistas de comboios eléctricos que o meu saudoso pai ia coleccionado. Eram vagões a duas escalas e infelizmente foram-nos furtados aqui há uns anos da garagem onde guardávamos quase tudo. Tinha uma bela colecção de vinil, um leitor de cassetes stereo e uma tv a preto e branco japonesa com o botão on já touch pad... cresci de resto na rua, até tarde nas horas, entre carros de rolamentos, corridas de bicicletas, jogos de caricas com as camisolas dos clubes e outras inventivas actividades como o pião, o prego e acertar nos cloegas com bagas que cresciam nas árvores da zona, sopradas por tubos de vinil..ui se doía. Para não falar nas escapadelas até aos túneis do ping ping ou visitas até ao bairro da rua B. Mais coisas há mas tudo era saudável e acontecia a um ritmo que permitia acreditar que amanhã era apenas mais um dia feliz. Abraço nostálgico de um quarentão :)

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  6. Pois é meninos, eu no final do ano também fico muito nostálgica...mas que foi bonito este episódio do «conta-me como foi», lá isso foi

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  7. Acerca da televisão, eu sou do tempo dos primórdios da dita cuja, nessa altura andava a estudar em Lisboa e no bairro onde eu vivia, havia uma associação de moradores, onde havia uma televisão (nesse tempo ainda poucas pessoas tinham televisão em casa), cada adulto pagava 1$00, os jovens e crianças iam à borla, e então para não se gastar muita electricidade, desligava-se a televisão durante o tempo dos anuncios, era a altura para se opinar acerca dos programas que passavam, e comia-se pão com manteida, marmelada ou doce, que as mães e avós faziam em casa, e quanto ao yogurte, só comi o primeiro quando fiquei grávida da minha filha mais velha, e mesmo assim, tinha que os ir buscat à UCAL em Santarém, e só tinham a duração de 3 ou 4 dias... mas todos se davam bem.

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  8. eu sou do tempo em que um pacote de manteiga custava 25 tostões e fui ver o Último Tango em Paris com a minha namorada e os pais dela :)

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